quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Crítica | O Juiz

por Victor Hugo Furtado

“O Juiz”, mistura três consagrados enredos de hollywood, o filme de tribunal (popular principalmente no anos 80), o filme de reencontro das raízes na pequena cidadezinha do interior (por sinal muito bem enquadrada) e por último, mas não menos importante, o filme de reconciliação entre pai e filho.

O longa acompanha a vida de Hank Palmer, um advogado importante de uma grande metrópole dos Estados Unidos que se vê obrigado a voltar a sua pacata cidade natal quando a notícia do falecimento de sua mãe chega até ele no meio de um julgamento.

Distante da família há muitos anos e com sérias desavenças com o pai (Robert Duvall), um juiz local respeitado e importante que está sendo acusado de assassinato, Hank irá passar por provações que colocarão todo o seu talento como homem da lei à prova, bem como sua capacidade de encarar os fantasmas do passado e de se reconectar com um lado importante da sua vida que, com o tempo, foi sendo deixado de lado.


Robert Downey Jr. não foge muito de sua figura com poder de eloquência do qual já está acostumado a fazer em “Homem de Ferro”, e também usa da bola de cristal durante o filme, na pele de um advogado que conhece a população por sua linguagem corporal, como em “Sherlock Holmes”. Mesmo seu personagem, Hank Palmer, ser um personagem já “manjado” em hollywood, ele desempenha com destreza, e por vezes cativa com eficiência, tanto nas cenas de comédia romântica, quanto na bonita relação com seus irmãos.

O velho de guerra – indicado em seis ocasiões e numa delas, dono da estatueta - Robert Duvall dá o tom dramático e autoritário, também já acostumado a transcender tal figura desde os tempos de “Grande Santini”. Além de passar a experiência na empreitada, “se joga” em alguns clichês e também se arrisca cenas fortes. É bem possível que seja indicado pela sétima vez ao Oscar, seria a quarta como coadjuvante.

A surpresa fica por conta de o diretor ser David Dobkin, o mesmo que dirigiu as comédias “Bater ou Correr em Londres”, “Penetras Bons de Bico” e o pífio longa de aventura: “Jack: O Caçador de Gigantes”. Escrito com auxilio de Nick Schenk e Bill Dubuque, o roteiro de “O Juiz” não é muito sofisticado, mas certamente valerá uma indicação.

Pra quem gosta de filmes de reconciliação dramática e aventura moderna, e que também está de olho no Oscar 2015, sairá satisfeito da sessão de “O Juiz”.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Crítica | TRASH: A Esperança vem do Lixo

por Victor Hugo Furtado

Inspirado no romance homônimo do escritor britânico Andy Mulligan, trata da história de Rafael (Rickson Tevez) e Gardo (Eduardo Luís), dois garotos de 14 anos que vivem como catadores de um lixão e moram numa palafita. Certo dia, Rafael encontra uma carteira que pertenceu a José Ângelo (Wagner Moura). Pega o dinheiro, divide-o com o amigo e resolve guardá-la.

Quando a polícia vai até o lugar, os dois entendem que existe algo maior naquele caso e convidam Rato (Gabriel Weinstein), um menino que vive no esgoto, para ajudá-los a descobrir o mistério. A aventura os leva a um segredo que vai afetar a vida de boa parte do Rio de Janeiro.

O interessante de “TRASH”, é que a narrativa poderia ser exportada para qualquer país emergente ou de pouco poder burguês, ou simplesmente em países de um sistema de corrupção de conhecida identidade. Três garotos abaixo da linha da pobreza, que encaram algo maior do que suas pequenas compreensões, e que mirabolantemente escapam da morte diversas vezes, na maioria delas, com a força da inocência.

Estes garotos, diferente dos demais filmes que envolvem crianças, que não deixam na maioria das vezes sua assinatura, conquistam logo de cara o espectador, eu diria até, mais do que em “Cidade de Deus”, onde a atuação dos mais de 30 meninos muda o rumo da história, mas que não se guarda grande lembrança de algum deles - menos Douglas silva, esse sim é lembrado.


Estrelas maiores do Pôster do filme, Wagner Moura e Selton Mello chegam a lembrar Brad Pitt na distribuição de “Doze Anos de Escravidão” na Itália, juntos, fazem parte de não mais do que 30 minutos do longa, de mais de duas horas. Ao que se é proposto para as estrelas de luxo brasileiras, é preciso salientar que os dois discorrem com certa perfeição, dadas as interpretações.

A Já conhecida e queridinha por muitos no meio cinematográfico, Rooney Mara (Os Homens que não Amavam as Mulheres) termina por ser quase que desperdiçada, concentrando-se em apenas uma ou duas cenas “agua com açúcar”. A estrela maior, Martin Sheen, dá vida a um personagem típico do que podemos chamar de experiente, aparece pouco, com certa intensidade, mas que não chega a mudar os rumos da história.

TRASH é o nosso “Quem quer ser um Milionário”, bom filme, com ótima direção do britânico Stephen Daldry (“Billy Elliot”, “As horas”, “O leitor”), que já fora indicado ao Oscar em três oportunidades, e é justamente isso, que fará brilhar os olhos do brasileiro. Se não conseguimos infelizmente com nossas mãos, conseguiremos com uma ajudinha amiga.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Garota Exemplar: Suspense eletrizante e envolvente

por Dáphine Ponte

Caso Suzane Von Richtofen. Caso Isabella Nardoni. Estes foram alguns dos crimes brasileiros mais famosos e que mais causaram comoção nacional por conta da participação direta da imprensa seja fazendo coberturas interrompendo toda a programação ou em programas em que os apresentadores entrevistam familiares das vítimas e psicólogos para definir o perfil dos assassinos. Como formadora de opinião, a mídia fez com que a população tomasse partido do âncora de telejornal ou do apresentador do programa de variedades e condenasse os possíveis suspeitos antes mesmo da elucidação dos casos.

Explorando essa relação em que a imprensa sensacionalista faz com o público, Gillian Flynn, crítica de televisão da Entertainment Weekly, escreveu o best-seller Garota Exemplar/Gone Girl, que vendeu seis milhões de exemplares em todo o mundo, ficando atrás apenas da trilogia “BDSM água com açúcar” Cinquenta Tons de Cinza.

A trama inicia com o desaparecimento da escritora Amy Dunn (Rosamund Pike, The World’s End) no dia de seu quinto aniversário de casamento com o também escritor Nick (Ben Affleck, Aposta Máxima), que realiza uma denúncia à polícia assim que vê a porta da casa arrombada e alguns objetos quebrados pela casa. Nick faz questão de colaborar com a detetive Rhonda (Kim Dickens), mas parece estar um tanto nervoso com a situação, até briga com os policiais e com os voluntários das buscas. O que ele está escondendo?

As buscas se avançam. No entanto, a falta de informações e a aparente desconsideração de Nick pelo caso fazem com que a mídia crucifique-o e considere que ele é o principal suspeito do desaparecimento de Amy. Garota brilhante, linda e inteligente, boa moça, esposa dedicada ao marido, por que Nick iria fazer isto com ela? Será que o casal era feliz em seu matrimônio? O que há por trás disso tudo?

A adaptação cinematográfica da obra fica a cargo do diretor David Fincher, que resgatou o tino para a direção desde a versão americana de Os homens que não amavam as mulheres. A trama é roteirizada pela própria Gillian Flynn, que juntamente a Fincher prendem o espectador a cada segundo com uma atmosfera densa e mistério ao mostrar o íntimo de cada personagem, equilibrando nos três atos da trama a visão de cada um. Aos poucos, o diretor e roteirista vão fazendo com que as máscaras dos personagens caiam, revelando o que há por trás do casamento de Amy e Nick.

Ben Affleck passa firmeza ao interpretar o marido canalha que despreza, maltrata e trai a esposa cheia de predicados. Sempre achei que Ben tinha uma única expressão em todos os filmes em que ele fez que era a de “maior abandonado” e dessa vez combinou com o personagem que se mostrava um verdadeiro panaca e escroto no início da trama e que depois não sabia que rumo tomar para sair da situação em que se encontrava.

Mas a melhor atuação no filme e acredito que também soube envolver o espectador é Rosamund Pike. A atriz estava primorosa como a esposa exemplar que, aos poucos, mostrou um caráter dúbio. Manipuladora, fria e calculista, Amy maneja a todos que a cerca como meros fantoches. Com sua aparência angelical, Amy se mostra exemplar ao mostrar a face de boa esposa aos moradores da cidadezinha onde mora e para o espectador, fazendo com que homens e mulheres tomem partido dela e que Nick seja condenado à morte.

Destaque também para as atrizes Kim Dickens e Carrie Coon que interpretaram a detetive Rhonda e a irmã de Nick, Margo. Kim defendeu muito bem a detetive sarcástica e raivosa que queria resolver logo o caso, mas acreditava que havia algo errado em toda aquela situação. Carrie esteve bem como a irmã gêmea que também era o porto seguro de Nick. Não apenas para dar conselhos a Nick, mas também para ajudá-lo a mudar sua imagem perante a imprensa.

Outro destaque vai para o ator Neil Patrick Harris, que mesmo aparecendo pouco na trama como o antigo namorado obcecado por Amy, Desi Collings, que tinha mania de poder e achava que tinha Amy em suas mãos, que contribuiu para o desenrolar da trama como um personagem complexo, diferente das comédias que fez.

A fotografia do filme ficou a cargo de Jeff Cronenweth, parceiro de Fincher desde Clube da Luta que abusa de tons escuros e imagens parecidas com as de videoclipes. Percebe-se que, quando Nick aparece há tons de azul e cinza nas cenas, deixando o clima mais gélido e nos flashbacks de Amy são utilizados tons um pouco mais quentes como o amarelo. A trilha sonora fica por conta de Trent Reznor do Nine Inch Nails e de Atticus Ross que trabalharam com Fincher em A Rede Social e Millenium. Reznor e Ross compuseram trilhas que ajudaram a compor o clima de suspense, mistério e tragédia em determinadas situações.

Fincher soube prender e envolver o espectador de forma inteligente. Acredito que Garota Exemplar deu uma restaurada na carreira do diretor depois dos fracos A Rede Social e Millenium. Garota Exemplar é, sem dúvida, um dos maiores filmes do diretor.