domingo, 23 de fevereiro de 2014

Crítica | RoboCop: Politicamente educativo

por Victor Hugo Furtado

Diferente do RoboCop (1987) de Paul Verhoeven, ao que tudo indica, o policial robô de José Padilha não fará história, pelo menos para Hollywood. Aguardado pelo público e pela crítica, não apenas por se tratar da estreia de um diretor brasileiro nos comandos de um blockbuster milionário, mas também por resgatar um personagem emblemático dos anos 1980.

A grande questão levantada desde o momento em que o diretor brasileiro foi anunciado como diretor do remake, era se ele conseguiria imprimir o seu jeito tão particular em um filme que, pela lei hollywoodiana, deve "se pagar" e ainda gerar um lucro significativo, pois sem dos quais, ainda segundo essa, torna-se um fracasso.

robocopA resposta dessas questões foi respondida em alto e bom som, com frases de efeito, roteiro inteligente e sátiras bem armadas. Quem viu Tropa de Elite 1 e 2, não precisou nem dos créditos finais de RoboCop para constatar a presença singular do diretor brasileiro na trama policial-futurista.

O mesmo diretor que pôs em cheque a polícia, o governo e a omissão popular em seus filmes muito particulares feitos em terra macunaíma, põe numa nova mesa - de 130 milhões de reais - uma nova discussão: o uso da tecnologia no combate ao crime organizado.

Assim como nos "Tropas", Padilha insere diversos pontos de discussão em meio a trama central, como o marketing populista, a imprensa manipuladora, e a polícia como foco de esperança em dias melhores dados seus métodos mais ímpares, mas ao mesmo tempo não escolhe seu ponto de vista, deixando a critério do espectador.

O filme de Padilha é mais politico, diferente do de Verhoeven, que era mais filosófico e arrasa-quarteirão. Ele pode realmente ser levado a sério e como elemento vivo de discussão, afinal em quanto tempo estaremos abordando esses temas?

Em sua estreia, José Padilha teve desempenho invejável, e assim como seus outros filmes, é muito recomendado. Ao contrário do que se pensa, não é bem o tipo de filme recomendado para crianças, pois seus assuntos e as formas de mostrar o correto, são muito implícitas e ao mesmo tempo interpretativas. Segundo o próprio Padilha, RoboCop não é Homem de Ferro, e sim Frankenstein.






quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Crítica | Ela: Romance em um um futuro não muito distante

por Dáphine Ponte

Spike Jonze iniciou sua carreira como diretor de videoclipes de artistas como Björk, The Chemical Brothers e Yeah Yeah Yeahs. Estreou na direção em 1999 com a comédia incomum Quero ser John Malkovich, que conta a história de um homem que entra na mente de John Malkovich por quinze minutos, podendo ver o mundo com os olhos do ator. 

A tecnologia está cada vez mais presente no nosso cotidiano. Desde a invenção dos computadores pessoais a smartphones com aplicativos e gadgets que, praticamente, fazem de um tudo com um toque ou reconhecimento de voz. Temos como exemplo o Siri, aplicativo do iOS que usa processamento de linguagem natural para responder perguntas, fazer recomendações, e executar ações. Como se fosse uma secretária em seu smartphone auxiliando as pessoas em seus compromissos em tempo integral. Agora imaginem se desenvolvessem um sistema operacional com inteligência artificial e conversasse com você como se fosse uma pessoa, disposta a resolver seus problemas e quem sabe, ter um relacionamento amigável?

Em Ela (Her, 2013) isso é possível. A trama se passa em um futuro não muito distante onde a tecnologia está em toda parte. O protagonista, o escritor Theodore (Joaquin Phoenix, O mestre) trabalha em um serviço de cartas escritas à mão. Veja que as pessoas não quiseram acabar com o velho hábito de mandar cartas uns aos outros, mas pagam para outras pessoas escreverem, fazendo com que se alarguem ainda mais as distâncias. Recursos feitos no computador como apagar arquivos e corrigir palavras são realizados por reconhecimento de voz. Theodore é conhecido em seu trabalho por escrever lindas cartas e ter muita sensibilidade. Apesar disto, Theodore é um homem solitário e infeliz que se separou recentemente da esposa (Rooney Mara, Terapia de Risco). Ele passa os dias em sua casa jogando videogame em que um dos personagens é dublado pelo diretor, Spike Jonze, e fazendo sexo virtual em salas de bate-papo.

Theodore tem um casal de amigos, Charles e Amy, interpretados por Matthew Letscher e Amy Adams, respectivamente. Seus únicos amigos, aliás. Amy trabalha criando jogos e quando tem tempo, se dedica a um documentário. De início, percebemos que o casal não parece estar bem no relacionamento. Em uma cena em que Amy mostra uma das partes de seu documentário, Charles diz o que é melhor para ela fazer e os dois começam a brigar.

Um dia, o escritor vê a propaganda de um novo sistema operacional, o OS 1, que possui inteligência artificial, fazendo com que se adapte ao seu usuário. O SO de Theodore tem voz feminina chamada Samantha (Scarlett Johansson, Como Não Perder Essa Mulher) que, inicialmente, organiza e-mails e corrige erros nas cartas que Theodore escreve. Aos poucos, Theodore desenvolve uma relação de amizade com Samantha, conversando sobre outras coisas, como as impressões dela sobre o mundo ao invés de apenas dizer o que ele tem de fazer. 


Em uma noite, Theodore está chateado com o encontro que não deu certo. A mulher com quem ele saiu (Olivia Wilde) já demonstrou o interesse por um relacionamento mais duradouro e fez cobranças. Isso no primeiro encontro. Samantha confessa a Theodore que queria estar com ele. A partir daí, os dois começam a ter um relacionamento. Um relacionamento diferente, mas continua sendo um relacionamento com as cobranças, as preocupações, os medos, os planos e as falhas de um relacionamento entre pessoas.

A fotografia do filme ficou por conta do alemão Hoyte van Hoytema que utilizou cores diferentes em diversas situações. Tons pasteis são vistos em cenas em que Theodore está com Samantha conversando na rua ou no campo e tons de cinza e azul-escuro quando Theodore está em sua rotina solitária ou conversando com Samantha antes de dormir.

Assisti a esse filme achando que o protagonista iria se apaixonar apenas pela voz do sistema operacional como vi em uma matéria em que pessoas vão no Google Tradutor, digitam a frase “Eu te amo”, por exemplo, e passam a ouvir várias vezes com a conhecida voz do serviço de tradução. Ela torna tudo isso mais complexo quando mostra um sistema operacional sem face ou corpo capaz de sentir e expor seus sentimentos, chegando a se apaixonar por um homem. Acredito que Scarlett Johansson fazendo a voz de Samantha esteja em sua melhor “atuação”. Sua voz é tão marcante que faz com que pensem que Samantha está ao lado de Theodore, como ela comenta em uma cena.

O filme também mostra como a tecnologia une ainda mais as pessoas ao mesmo tempo que as afasta. Podemos ver várias pessoas conversando com seus sistemas operacionais juntas em um mesmo lugar, mas isoladas em seus mundos particulares.