por Victor Hugo Furtado
Filho de uma geração que se acostumou a ver filmes “sérios”, Quentin Tarantino é o ícone mais lembrado quando se fala em cinema da vida real. Sim, é evidente que sangue jorrando como chafariz por meros furos de um calibre 22 não são nada reais. Uma loira de mais ou menos 62Kg afugentando 100 ninjas asiáticos muito menos. Claro, porque não é essa a definição de realidade que está sendo tratada, e sim da linguagem e dos anseios do expectador de origem semelhante ao nosso cineasta.
Com personagens discutindo sobre valores e títulos de hambúrgueres estilo fast-food, interpretações das músicas de Madonna e diálogos entre o usuário e o traficante, Tarantino iniciou com Cães de Aluguel (1992) e logo depois Pulp Fiction – Tempo de Violência (1994) a assustar quem se deslocava as salas de cinema. Com raras exceções, para um público acostumado a diálogos longos, cenas pouco prováveis de lutas e tiroteios, vergonha da expressão dos fetiches e da “censura Pró-Oscar”, era nitidamente estranho para o expectador, ver um nerd de locadora viciado em faroeste, atrás da câmera principal.
Tarantino destaca-se, na medida em que suga o melhor de cada clássico que cresceu assistindo. A demanda encontrada no contexto de sua "prole" era justamente libertar-se de filmes convencionais – semelhante ao que Martin Scorsese fez em Táxi Driver (1976) - buscando uma realidade mais ampliada, não que fugisse da fantasia, mas que a transformasse ela em realidade, realidade essa que estava muito bem caracterizada no longa Pulp Fiction, que como nenhum outro, representa os anos 1990.
O cineasta do leste do Tennessee conquistou e continua conquistando uma legião de fãs ao redor do globo, que se apaixonaram pelo cinema feito com as próprias mãos, sem apegar-se ao que se deve ou não mostrar. O cineasta que diz: “Eu não me formei em cinema, eu fui ao cinema!” pode sim se orgulhar de ser um dos poucos diretores, assim como Hitchcock, Tim Burton, Spielberg e tantos outros clássicos - premiados ou não - que quando se pergunta em conversas de bar: “Como é o novo filme do Tarantino?”, o perguntado pode responder: “Ah, é Tarantino!”, e o resto se explica sozinho.